O Modelo Padrão passou em mais um teste detalhado: o limite GZK.
O que é o limite GZK?
Prótons se propagando no meio interestelar podem espalhar elasticamente dos fótons da radiação cósmica de fundo,
[onde p é o símbolo do próton e é o do fóton]. Porém, para prótons com energia maior que Et ~ 1010 GeV, aparece outra possibilidade: o próton pode ser convertido em um píon,
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Portanto, os prótons começam a desaparecer quando tem energia E > Et. Esse é o chamado efeito, ou limite de energia, GZK (Greisen-Zatsepin-Kuzmin). Prótons com tais energias vindo de fontes astrofísicas são raros: aqui na Terra aparece 1 a cada 10 km quadrados por ano.
Contradição aparente
Em 1998, uma análise preliminar de dados do experimento AGASA no Japão parecia indicar a inexistência do desaparecimento de prótons acima do limite GZK. Se isso fosse verdade, então poderíamos estar em face a novos efeitos ainda não conhecidos sobre as interações do próton. Isso parecia altamente razóavel, uma vez que a energia do próton acima do limite GZK é muito além de qualquer teste que já havia sido feito do Modelo Padrão em laboratório (cerca de ~ 200 GeV) e também relativamente próxima da energia esperada da grande unificação das forças nucleares (~ 1015 GeV).
Várias idéias foram exploradas que poderiam explicar a violação do limite GZK: talvez os campos magnéticos de núcleos de galáxias seriam muito mais altos do que se considerava antes (permitindo assim acelerar prótons e compensar o efeito do limite GZK); talvez novas partículas exóticas existem na Natureza que não perdem energia ao se propagar pela radiação cósmica de fundo; e até propostas altamente improváveis e quase decididamente erradas como a de que a velocidade da luz varia com a posição no universo, propagandeada por João Magueijo em um livro, motivada por uma especulação conhecida como Loop Quantum Gravity.
Solução do problema
A solução do problema começou a surgir com os primeiros dados do experimento HiRes. Em 2002, John Bachall e Eli Waxman (hep-ph/0206217) reanalisaram os dados do AGASA junto com os dados do HiRes e concluíram que havia consistência com o limite GZK, ao contrário da primeira análise precipitada do grupo do AGASA. Em março de 2007, HiRes publicou o resultado de medidas detalhadas do espectro de ráios cósmicos com energias superiores ao limite GZK e mostrou que de fato o limite é real (Phys. Rev. Lett. 100 101101).
No mês passado, o Observatório Pierre Auger — uma colaboração internacional a qual o Brasil tem participação importante tanto no desenvolvimento do experimento como na construção, envolvendo primordialmente o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) — obteve uma série de medidas independentes do HiRes que corroboram os mesmos resultados (astro-ph/08060.4302).
As observações experimentais recentes do HiRes e do Pierre Auger evidenciam que o limite GZK está correto. O Modelo Padrão passou em mais um teste.
6 comentários:
Prezado professor Leonardo Motta,
Dei com seu blog e gostei muito; vou passar a visitá-lo com assiduidade.
Numa de suas postagens, li seu desabafo com relação à falta de comentários. Peço não desistir por causa disso e vou logo dando minha cooperação concreta: este comentário.
Mas isso é só um preâmbulo: meu comentário, na realidade, é todo um blog, que poderá ser encontrado em
http://kosmologblog.blogspot.com/
o qual, em síntese, procura mostrar que a gravidade não causa acelerações, pois é uma aceleração: a aceleração local da expansão do Universo.
Espero merecer o privilégio de sua atenção e, quem sabe, um prestigioso comentário, mesmo não concordando comigo.
Abraços, G. G. da Silva
PS: coloquei no meu blog uma chamada para o seu, em “Vale a pena visitar”.
Caríssimo Dr. Motta,
Sobre o MP, ainda que não seja exatamente sobre o referido teste.
Certa vez estávamos conversando e você me disse que o Prof. Dr. Éboli disse algo como: "tomara que o Bóson de Higgs não exista, pois assim o MP está errado e teremos de começar tudo de novo". O que significa isso? Existe algo entre os físicos como "quero que o BH exista", "quero que o BH não exista", etc...?
"O que você quer?"
Qual é a importância do BH? Acho que você disse que ele "seria responsável por gerar a massa de todas as partículas". TODAS? Elétron, próton, méson-pi, quark up, W, Z, tau-neutrino, múon, etc...? Errei o nome de alguma?
A propósito, recentemente vi uns alunos do IF conversando e eles chamaram o professor citado acima carinhosamente de "Náboli"!!!
Bruno
"propostas altamente improváveis e quase decididamente erradas como a de que a velocidade da luz varia com a posição no universo, propagandeada por João Magueijo em um livro, motivada por uma especulação conhecida como Loop Quantum Gravity."
Leo, parece que você não gosta mesmo da LQG não é? Tá, enquanto a teoria de cordas não dé nenhum resultado concreto acho que devemos levar essas duas teorias em pé de igualdade, mesmo que uma delas pareça mais "agradável", ou mais "aceitável".
Até, vou comentar de vez em quando no seu blog.
@Bruno: rapaz, deixa dessa história de Dr Motta! :P Tem sido difícil as últimas duas semanas olhar no blog, por isso a demora na resposta. Vamos lá: na verdade o bóson de Higgs não é exatamente responsável pela massa das partículas, eu não entendo a questão dessa forma. O mais correto é dizer que a existência do bóson de Higgs permite colocar massas para todas as partículas de uma forma a satisfazer a simetria de gauge do modelo padrão. Mas o bóson de Higgs não é a única forma que permite fazer isso; o Weinberg e o Susskind descobriram já nos anos 70 uma forma alternativa chamada Technicolor (para citar um exemplo). A maioria das alternativas, no entanto, consiste em supor a existência de algo como o bóson de Higgs + alguma outra coisa, para evitar o problema da hierarquia.
Seria interessante que o bóson de Higgs não existisse, porque ai seria algo inesperado no LHC. É essa a origem do comentário do Éboli.
A prova do Éboli não é difícil, é razoável, no nível certo; o pessoal da USP que faz drama por qualquer besteira.
@Leandro: não me referia especificamente a LQG, mas a proposta fenomenológica inspirada em LQG de que a velocidade da luz varia com a posição :) Essa idéia era muito descabida. Não ficaria surpreso se ainda tem gente defendendo-a.
Olá G. G. da Silva,
obrigado pelos comentários! Não precisa chamar-me de professor, até porque não sou ;) Vou dar uma olhada com calma no seu blog quando tiver um tempinho, e faço um comentário com cuidado!
abraços []'s
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