Hoje no arxiv.org

 [post técnico]

chamou-me atenção o artigo,


arxiv:0807.3692

que mostrou o seguinte: um universo FRW com constante cosmológica (CC) e um fluido imperfeito com viscosidade proporcional a 1/Hb, com b> 1 um parâmetro constante e H o parâmetro de Hubble, tende a um universo de Sitter no futuro (quando o fator de escala vai a infinito) com um parâmetro de Hubble H inversamente proporcional a constante cosmológica nua (bare). Assim, é possível colocar uma constante cosmológica muito grande na Lagrangeana e obter um valor pequeno para a constante cosmológica observável, resolvendo o problema da constante cosmológica.

Algo tão simples, porque ninguém pensou nisso antes? Será meio embaraçoso se um fluido imperfeito for responsável pelo pequeno valor observado da CC... todas aquelas contas de superpotenciais na supergravitação de 11 dimensões vão para onde?  wondering

As equações de Maxwell e monopolos magnéticos

Por que existe carga elétrica, mas não existe carga magnética? Ampère e Maxwell mostraram como o campo magnético B se relaciona com uma corrente elétrica (cargas elétricas em movimento). A equação de Ampère-Maxwell no entanto não é suficiente para determinar o campo magnético. É necessária uma equação análoga a lei de Coulomb (ou Gauss), mas como aparentemente não existem cargas magnéticas na Natureza, Maxwell impôs a mesma lei de Gauss para o campo magnético mas com carga zero. No entanto, é possível mostrar que as equações de Maxwell possuem uma simetria: coloque nas equações uma carga magnética

junto com uma corrente de cargas magnéticas. Nesta forma, as equações de Maxwell possuem uma simetria de rotação: se E e B são soluções da equação de Maxwell para as densidades de cargas elétricas e magnéticas ,  e respectivas correntes, então também é solução das equações os campos E' e B' dados por


onde  é uma matriz (operação de) rotação por um ângulo , para cargas elétricas e magnéticas rotacionadas pela mesma operação R. Visto dessa forma, a ausência de cargas magnéticas é uma mera convenção de unidades, uma escolha de definição dos campos elétrico e magnético. Isso não é surpreendente porque quando se muda o referencial, campos magnéticos e elétricos se misturam. A carga magnética introduzida dessa forma é chamada de monopolo magnético de Dirac.

O monopolo de Dirac pode ser eliminado o tanto que o ângulo  seja um parâmetro livre, sem nenhum mecanismo particular para fixa-lo. Até hoje, todos os experimentos parecem indicar que sempre podemos eliminar a carga magnética. 

Monopolo de 't Hooft e Polyakov


Nos anos 70, Polyakov e 't Hooft descobriram um mecanismo físico que pode fixar o valor do ângulo , implicando na existência de monopolos magnéticos com efeitos físicos.

Já se sabe que as equações de Maxwell são apenas um pedaço de um conjunto maior de equações, que incluem outros campos Ea, Ba além dos campos elétrico e magnético (sendo a = 1,2,3). O conjunto completo de equações é conhecido como a teoria eletrofraca, descoberta por Steven Weinberg e Abdus Salam. A interação entre duas cargas elétricas envolve tanto os campos elétricos e magnéticos quanto os campos fracos Ea, Ba, só que a lei de Coulomb para os campos fracos é do tipo ~ exp(- 10 r/ro)/r2 onde ré o raio do próton. Portanto, assim que as distâncias entre as cargas é maior que mais ou menos um décimo do raio do próton, os campos fracos decaem exponencialmente e rapidamente se tornam imperceptíveis em comparação com os campos eletromagnéticos. Mas quando se estuda a interação entre cargas elétricas a distâncias comparáveis ao raio do próton, esses efeitos se tornam perceptíveis. Dois elétrons se afastam tanto porque trocam fótons como também porque trocam partículas da interação fraca.

Uma vez que a força eletromagnética é um pedaço da teoria eletrofraca, é natural imaginar a possibilidade de que os campos eletrofracos e os campos da força nuclear forte (responsável por manter os núcleos atômicos coesos) podem ser parte de um conjunto único de equações, que mistura todos esses campos. Essa proposta é conhecida genericamente pelo nome de GUT (Grand Unified Theory). Em algumas GUTs [aquelas em que o campo de calibre não é simplesmente conexo], campos que interagem com todos os campos da GUT geram uma carga magnética automática, fixando o valor do ângulo  e impedindo assim que possamos remover a carga magnética por uma redefinição dos campos. Tipicamente, esses campos estão associados a partículas muito pesadas, ~ 1015 GeV (para uma comparação, o LHC colidirá prótons com energia de ~ 104 GeV), e portanto os efeitos só são importantes na escala subatômica, explicando a ausência de monopolos magnéticos nas reações estudadas até hoje em aceleradores de partículas. Oriundas desse mecanismo, estas cargas magnéticas são chamadas de monopolos de 't Hooft-Polyakov.

Estes monopolos são estáveis. Estima-se que uma grande quantidade deles deveria ter sido formada no universo primordial e sobrevivido até hoje, permeando o universo igual como a radiação cósmica de fundo. No modelo do Big Bang sem inflação, a densidade atual de monopolos magnéticos deveria ser ~ um monopolo por próton ou nêutron (i.e. um por nucleon). Naturalmente isso não é observado. Se o modelo inflacionário estiver correto, a densidade atual poderia ser bem menor que 10-30 por nucleon, mostrando que não há como descartar a existência desses monopolos magnéticos por enquanto.

Então, se o eletromagnetismo e a força fraca forem na verdade parte de uma teoria mais fundamental que incorpora a força forte, é possível que existam monopolos magnéticos na Natureza.

Monopolos magnéticos e discretização da carga elétrica


Uma motivação, ou atrativo, de se introduzir monopolos magnéticos é que a existência deles resolve o problema da discretização da carga elétrica. Dirac mostrou que se existem monopolos magnéticos, então a carga elétrica tem que ser discretizada, isto é, os valores permitidos para a carga elétrica de sistemas físicos deve ser um múltiplo inteiro de uma constante universal. O valor da constante não é fixado, mas isso explicaria porque todos os bárions observados na Natureza sempre possuem ou zero, ou uma, ou duas ... vezes a carga do elétron (ao invés de, digamos, 8/3 ou 1.314 vezes a carga do elétron).


Referências técnicas
  1. Para o monopolo de Dirac, J. D. Jackson, Classical Electrodynamics, John Wiley (edição 2 ou 3)
  2. S. Weinberg, The Quantum Theory of Fields, Vol. 2, Cambridge University Press, cap. 23
  3. S. Coleman, Aspects of Symmetry, Cambridge University Press, cap. 6-7
  4. papers do 't Hooft.
  5. M. Nakahara, Geometry, Topology, Physics, Taylor&Francis, para os aspectos matemáticos (grupo de cohomologia do espaço de soluções, etc.)

Modelo Padrão passa em mais um teste

O Modelo Padrão passou em mais um teste detalhado: o limite GZK.

O que é o limite GZK?

Prótons se propagando no meio interestelar podem espalhar elasticamente dos fótons da radiação cósmica de fundo,

  (1)

[onde p é o símbolo do próton e é o do fóton]. Porém, para prótons com energia maior que Et ~ 1010 GeV, aparece outra possibilidade: o próton pode ser convertido em um píon,

(2)

Portanto, os prótons começam a desaparecer quando tem energia E > Et. Esse é o chamado efeito, ou limite de energia, GZK (Greisen-Zatsepin-Kuzmin). Prótons com tais energias vindo de fontes astrofísicas são raros: aqui na Terra aparece 1 a cada 10 km quadrados por ano.


Contradição aparente

Em 1998, uma análise preliminar de dados do experimento AGASA no Japão parecia indicar a inexistência do desaparecimento de prótons acima do limite GZK. Se isso fosse verdade, então poderíamos estar em face a novos efeitos ainda não conhecidos sobre as interações do próton. Isso parecia altamente razóavel, uma vez que a energia do próton acima do limite GZK é muito além de qualquer teste que já havia sido feito do Modelo Padrão em laboratório (cerca de ~ 200 GeV) e também relativamente próxima da energia esperada da grande unificação das forças nucleares (~ 1015 GeV).

Várias idéias foram exploradas que poderiam explicar a violação do limite GZK: talvez os campos magnéticos de núcleos de galáxias seriam muito mais altos do que se considerava antes (permitindo assim acelerar prótons e compensar o efeito do limite GZK); talvez novas partículas exóticas existem na Natureza que não perdem energia ao se propagar pela radiação cósmica de fundo; e até propostas altamente improváveis e quase decididamente erradas como a de que a velocidade da luz varia com a posição no universo, propagandeada por João Magueijo em um livro, motivada por uma especulação conhecida como Loop Quantum Gravity.



Solução do problema

A solução do problema começou a surgir com os primeiros dados do experimento HiRes. Em 2002, John Bachall e Eli Waxman (hep-ph/0206217) reanalisaram os dados do AGASA junto com os dados do HiRes e concluíram que havia consistência com o limite GZK, ao contrário da primeira análise precipitada do grupo do AGASA. Em março de 2007, HiRes publicou o resultado de medidas detalhadas do espectro de ráios cósmicos com energias superiores ao limite GZK e mostrou que de fato o limite é real (Phys. Rev. Lett. 100 101101). 

No mês passado, o Observatório Pierre Auger — uma colaboração internacional a qual o Brasil tem participação importante tanto no desenvolvimento do experimento como na construção, envolvendo primordialmente o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) — obteve uma série de medidas independentes do HiRes que corroboram os mesmos resultados (astro-ph/08060.4302).

As observações experimentais recentes do HiRes e do Pierre Auger evidenciam que o limite GZK está correto. O Modelo Padrão passou em mais um teste.